O país sui generis
O Brasil é um país sui generis. No mundo inteiro, quando a economia dá sinais de fraqueza, as taxas de juros caem em antecipação a novos cortes para estimular a economia. No Brasil, mesmo com o alto desemprego e capacidade ociosa que garantem a baixa inflação, após a revisão do PIB para baixo a taxa subiu. Hoje o mercado precifica +1,5% de aumento na SELIC ainda esse ano, e outros +3% em 2019.
Países com baixas reservas e alto déficit em conta-corrente sofrem ataques cambiais, como sofremos em 98 e 02. O Brasil atualmente tem a 8ª maior reserva cambial do mundo, maior do que a recomendada pelo FMI, e com a depreciação do Real passou a ter superávit em conta-corrente. Apesar disso, o Real é a 3ª pior moeda no ano.
A bolsa também está repleta de distorções. Os papéis não respeitam mais as tendências operacionais. Enquanto o preço do aço na China está no maior valor da história e a demanda brasileira está subindo dois dígitos, a Usiminas cai 10% no ano e negocia nos múltiplos (proxy de valuation) mais baixos que costuma negociar.
Esse é o preço de aço (bobina quente) em BRL na China nos últimos 5 anos. Aço chinês é referencia para o preço aqui no Brasil, por conta das importações. No mesmo período a ação da Usiminas caíu -30% (olhando o preço de hoje). Qual é a explicação? pic.twitter.com/umJbImC6cc
— Fundo Versa (@FundoVersa) 4 de setembro de 2018
Já a rede de drogarias Raia-Drogasil, que sempre negociou a múltiplos altos pelas expectativas de crescimento e aumento da rentabilidade perdeu vendas, perdeu margens, apontou dificuldades no plano de expansão, mas continua no maior valuation da sua história
Apesar da piora operacional (vendas-mesmas-lojas das maduras negativas e das novas declinante, e queda nas margens), do retorno declinante e do stress no mercado, Raia-Drogasil está próxima aos múltiplos mais altos de sua história. Até quando vai segurar? pic.twitter.com/XW7n9UmJeD
— Fundo Versa (@FundoVersa) 23 de agosto de 2018
Até empresas com drivers similares têm comportamento oposto. A industrial de auto-peças Iochpe-Maxion, que tem 85% da sua operação no exterior e beneficia-se diretamente da depreciação do Real, cai -4% no ano e negocia a múltiplos baixos. Do outro lado a industrial produtora de motores elétricos WEG tem 50% da operação no exterior, sobe +2% no ano, está na máxima histórica e nos múltiplos mais altos que costuma negociar.
Os papéis estão mais voláteis e o fluxo passou a dominar. Como explicar?
O joguete
A Bolsa fica pequena nas mãos dos grandes players locais e estrangeiros. Um dos grandes players, os fundos de ETFs, não existiam até poucos anos atrás. Hoje boa parte do fluxo vem através desses índices que, concentrados em algumas ações, compram-nas e vendem-nas a qualquer preço. Outros novos players importantes são os robôs, muitos estrangeiros, comprando e vendendo baixos volumes mas causando perturbação no mercado. Por último os macro-funds aumentaram as carteiras de ações, mas ao invés de investir, usam-nas para especular. O resultado é a criação de fatores-de-estilo, como ações defensivas e agressivas. No nosso conceito de investimento, ações defensivas não são as que caem pouco nas quedas e sobem pouco nas altas. Para nós, ações defensivas são as que têm um negócio rentável, baixo endividamento e valuation barato.
Para piorar o ambiente especulativo, próximo às eleições começam os trackings eleitorais. Fundos abastados contratam consultorias que reproduzem a metodologia dos instutos, e fazem pesquisas concomitantes para antecipar os resultados. É o insider legalizado.
Em momentos de grande stress como o atual questionamos diariamente nossas convicções. Falamos com as empresas, com concorrentes e fazemos reuniões com analistas dos maiores bancos em busca dos erros nos nossos investment-cases. Ao final, eliminamos os casos mais fracos da carteira, controlamos a alavancagem do fundo, e esperamos passar.
O Versa é um fundo alavancado, como mostramos quinzenalmente neste relatório. A alavancagem é o foguete na subida e a gravidade na descida. Foi a combinação do stock-picking com a alavacangem que trouxe os fortes resultados de 2016, 2017 e do início de 2018. Ela também é a responsável pela forte queda desde então. Esta é a proposta do Versa a qual não abrimos mão pois os recursos dos sócios estão investidos neste veículo. Para os que gostam da nossa filosofia de investimentos mas não toleram tamanha volatilidade, abrimos o Versa Fit, com metade do risco do Versa. A volatilidade do Fit é similar à do índice Bovespa.
Resultado
Agosto expôs o risco da alavancagem através do long & short. O primeiro risco é o descasamento de beta, quando as carteiras se movem de forma relevante em direções contrárias. Enquanto a bolsa caiu -3,2% a carteira comprada do Versa caiu -4,9% e a vendida à descoberto subiu +3,5%. O segundo risco é a alavancagem. Considerando a proteção no S&P, o fundo teve 2,3x o patrimônio comprado e 1,8x o patrimônio vendido na média no período.
31-jul-18 | 31-ago-18 | Variação | |
Versa | 6,290 | 5,066 | -19,4% |
CDI aa | 6,4% | 6,4% | +0,6% |
Ibovespa | 79.220 | 76.678 | -3,2% |
Volatilidade é a medida de agitação dos mercados. Quanto maiores as oscilações diárias, maior a volatilidade. No artigo sobre clusters, mostramos que ela cai nos mercados altistas e sobe nas correções. Em outras palavras, as quedas são mais agudas e duram menos tempo, as altas são menores e mais duradouras. O Versa é um conjunto de ativos com estas características, que acaba incorporando. A volatilidade do fundo aumenta junto à do mercado e as quedas são mais agudas que a altas.
Apesar da pequena queda do Ibovespa, a volatilidade dos mercados aumentou em agosto. Para controlar o fundo fizemos, mais uma vez, reduções nas carteiras comprada e vendida a descoberto. Além de readequar a exposição do fundo, reduzimos o descasamento de beta da carteira, mas sem eliminá-lo, pois este será um dos propulsores do fundo quando o mercado acalmar.
Livro | Posição Líquida | Lucro (Prejuízo) |
Long | 229% | -11,3% |
Short | -180% | -6,2% |
Opç Bolsa | +52% | -2,4% |
Opç Dólar | -15% | -1,1% |
CDI | +0,6% | |
Taxas | -0,2% | |
Resultado | -19,4% |
Boa parte da carteira vendida a descoberto do Versa tem caráter “defensivo”, como RaiaDrogasil, IRB e Weg. Já a carteira comprada está concentrada em ações que dependem da recuperação econômica, como Hering, Usiminas, Br Properties e as construtoras. Avaliamos que o concentração das posições vendidas a descoberto foi o principal responsável pela performance negativa do mês. Por isso reduzimos o tamanho limite das posições vendidas, e estamos diversificando a carteira. Ainda, como o hedge no S&P adicionava risco ao fundo, zeramos a proteção no meio de agosto com prejuízo de -1%, o que poupou-nos a perda da última alta.
Após os ajustes a carteira do Versa diminuiu, mas preservou o otimismo. Como falamos no artigo sobre as eleições, no valuation atual a bolsa está atrativa considerando a continuação do ciclo de recuperação da economia, que depende da Reforma da Previdência. Todos os candidatos exceto o PT têm planos para fazê-la no início do mandato. Vemos baixa probabilidade do PT ganhar, mas pode ir ao segundo turno fazendo a volatilidade durar até o final das eleições. Por outro lado a ausência do PT no segundo turno pode precipitar um rally na bolsa tão logo as pesquisas indiquem este cenário. Por isso mantemos a alavancagem direcional através de opções de índice com vencimento em dezembro.
Variação Ação | Perdas Versa | |
IRBR3 | +11% | -3,0% |
VLID3 | -19% | -2,6% |
VVAR11 | -21% | -2,1% |
RADL3 | +4% | -2,0% |
USIM5 | -9% | -1,9% |
BEEF3 | -23% | -1,9% |
maiores perdas em agosto
A perda de IRB aconteceu no início do mês, como comentamos no resultado quinzenal. Valid caiu após noticiarem que o governo está estudando medida para suspender a emissão de nova carteira de motorista a cada 5 anos, na renovação do documento. Continuaria a haver renovação, com o documento antigo. Esperamos que a Valid continue a divulgar resultados crescentes nos próximos trimestres e gostamos das opcionalidades de receita que tem, entretanto o negócio de identificação representa 60% do lucro operacional da cia a redução impacta o valuation das ações. Após a queda o papel negocia abaixo do valor patrimonial, valuation barato considerando a continuidade de parte do negócio de indentificação. Via Varejo caiu sem notícias desabonadoras. Gostamos das iniciativas da empresa para retomar as vendas, como o novo sistema nas lojas, e vemos grande potencial no negócio de crédito ao consumidor. Continuamos acionistas da Via Varejo, mas reduzimos a posição em função da grande volatilidade do papel. RaiaDrogasil é um exemplo no qual previmos corretamente os resultados da empresa, mas erramos o comportamento do papel. Para piorar a alta taxa de aluguel custou -0,7% no mês. Reduzimos a posição para enquadrá-la aos novos limites. Em agosto Usiminas parou temporariamente as operações após a explosão da torre de gás em Ipatinga, o que causou perdas temporárias à empresa. As perdas são pequenas e não justificam a queda do papel. A guerra comercial do Trump com a China causa temor que o aço chinês seja revertido para o Brasil. Por outro lado a desvalorização do Real protege o mercado interno. A moeda também favorece a exportação de carne, porém as dívidas em Dólar têm feito as ações da Minerva caírem já que o endividamento está atingindo níveis alarmantes. A empresa tem planos de emitir ações no exterior para diminuir a alvancagem. A única notícia positiva do mês foi Hering, que subiu 11% como reflexo do valuation descontado e da melhora nas perspectivas de vendas.
Está difícil, mas não vamos esmorecer. Continuamos aplicando a mesma receita de investimentos que trouxe resultado até aqui, esperando o mercado acalmar. Não vemos razões para mudar nosso call para a economia, e esperamos que a nuvem eleitoral se dissipe em breve e o sol volte novamente a brilhar.