O fundo Versa na turbulência política

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Prezados cotistas,

A delação da JBS, divulgada na quarta feira após o mercado fechar, foi um grande e imprevisível terremoto. A queda acentuada dos ativos financeiros fez a Bolsa interromper temporariamente os negócios (circuit break), e lembrou os dias loucos da crise de 2008. A diferença, dessa vez, foi a imprevisibilidade. Conhecido como cisne negro (black swan), foi um evento cuja perda excede largamente a previsão dos modelos estatísticos, como o VaR (value-at-risk). O VaR do Versa calculado na segunda feira usando dados de 3 meses era 3,2%, ou seja, apenas 5% das quedas do fundo deveriam exceder esse valor. Caímos 7,3%, o que o modelo atribuia probabilidade de 0,02% de acontecer (1 pregão a cada 20 anos). Essa diferença do VaR para a realidade, na qual eventos extremos acontecem com maior frequência do que o previsto, é um fato estilizado conhecido como caudas longas. Apesar do VaR usar a distribuição normal para fazer as estimativas de retorno, sabe-se que a distribuição de probabilidades real é leptocúrtica. Ainda assim, foi surpreendente.

Nos dias anteriores ao terremoto, aos poucos começamos a aumentar a exposição da carteira a ativos de maior beta, como ações da siderúrgica Gerdau, da fabricante de autopeças Iochpe-Maxion, da varejista Via Varejo e da construtora Even; em função da recuperação econômica que se iniciou e das aprovações das reformas, que parecia se aproximar. Como investidores fundamentalistas, não fazemos apostas em eventos, mas reagimos à melhora dos indicadores da economia. A reforma da previdência é importante para solidificar esse caminho, mas não é o motor por trás da recuperação. O propulsor da melhora econômica é a queda da inflação, que tem permitido o Banco Central derrubar os juros, estimulando o crédito e investimentos, e ajudando as famílias a desalavancar que, ajudadas pela liberação das contas inativas do FGTS, estão voltando a consumir. Assim, preocupa a possibilidade da crise atual levar a uma pausa na queda da inflação e, consequentemente, ao fim do ciclo de corte de juros, mas não há sinais que isso irá acontecer. A alta capacidade ociosa da indústria e o desemprego, situação que pode se agravar com a crise, não permitem as empresas expandirem suas margens, e sufocam o aumento de preço dos serviços, segurando a inflação. Uma alta expressiva do dólar, por outro lado, poderia pressionar as matérias primas básicas (commodities), e a inflação. Por sorte estamos colhendo uma super-safra de grãos, o que ajuda a conter a alta dos alimentos, e de qualquer forma o Banco Central dispõe de instrumentos e fôlego para combater um ataque especulativo ao Real e não hesitará em segurar a moeda, como fez nos últimos dias. Após subir 8% na quinta-feira, o dólar caiu 4% na sexta. Assim, acreditamos que os cortes de juros continuarão, mesmo que em ritmo mais lento e durante mais tempo, continuando a impulsionar a recuperação da economia. Por isso não fizemos mudanças na carteira, e aproveitamos a queda para aumentar pontualmente algumas posições.

É óbvio, por outro lado, que a incerteza política aumentou. Apesar da sua fragilidade, não será fácil tirar Michel Temer da presidência, o que pode levar à paralisia da atividade legislativa. Imediatamente após a notícia dos grampos, partidos da oposição protocolaram pedidos de impeachment na Câmara que, para prosperarem, precisam primeiro ser aceitos por Rodrigo Maia (DEM), aliado do Presidente, e depois aprovado por 2/3 da Câmara e do Senado. Tendo em vista as recentes votações nas casas, com o material divulgado até agora é difícil imaginar que o apoio de Temer se reduzirá a menos de 1/3 dos congressistas. Outra possibilidade de afastamento está no julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE, no dia 6 de junho. Apesar da condenação parecer inevitável, Temer entrará com recursos no TSE e depois no STF, e provavelmente permanecerá no cargo enquanto estes não forem julgados. Se todas as defesas do Presidente falharem, convocar-se-á eleições indiretas onde votarão apenas os congressistas e, por isso, um representante do grupo dominante deverá ser eleito. Desta forma, é baixo o risco de uma mudança ideológica, uma guinada à esquerda, que poderia comprometer definitivamente a recuperação da economia. Ficamos, portanto, com um cenário político conturbado mas caminhando na mesma direção, onde as reformas podem atrasar mas não serão descartadas, e as principais diretrizes adotadas por este governo serão mantidas. Um atraso de 6 meses na reforma da previdência, por exemplo, teria impacto negligenciável, uma vez que o grande impacto nas contas públicas dar-se-á após 10 anos. O esfacelamento das lideranças políticas, por outro lado, abre espaço para novos nomes como João Dória, com políticas desestatizantes, ou mesmo o consagrado ministro da fazenda Henrique Meirelles, que trariam grande impacto na confiança e nos mercados, mesmo que apenas em 2018.

Concluindo, decidimos assistir passivamente a mais esse capítulo lamentável da história do Brasil. Se a economia der sinais de arrefecimento, ou se a política apontar para uma nova mudança de rumo, reavaliaremos os investimentos e adaptaremos a carteira ao novo cenário, sempre guiados pelos fundamentos das empresas e dos setores nos quais se inserem. Enquanto isso, é provável que a volatilidade do mercado continue alta, e as oscilações da carteira também. Aconselhamos aos cotistas diminuir a frequencia com que olham o resultado do fundo. Estamos a disposição para esclarecimentos, não hesite em nos contactar.

Um abraço,

Luiz Fernando Alves

3 COMMENTS

  1. Diante da turbulência instalada no país, não há como deixar de olhar o fundo todos os dias. Entretanto, o seu coerente comentário me transmitiu a uma certa tranquilidade de que o fundo não obstante a performance, seguirá “vigilante”.

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