Comitê Semanal (23/12) – Atividade Anima; Mais Cautela nos Juros

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Em uma semana morna no exterior, a recuperação da atividade no Brasil continuou a brilhar. Externamente, o acordo EUA-China e as eleições na Inglaterra ainda reverberaram positivamente  mas os indicadores econômicos não trouxeram muitas novidades. No plano interno, a forte criação de empregos no Caged e o avanço dos indicadores de confiança deram o tom, apontando para uma recuperação mais robusta. Por outro lado, os dados de inflação e , especialmente, a comunicação do Bacen, impuseram mais cautela nas apostas de corte de juros em 2020. Mesmo assim, um último corte de 0.25% em fevereiro ainda nos parece o cenário mais provável.

 

Mundo: mais do mesmo

O  impeachment do presidente Trump dominou o noticiário,  porém sem grande efeitos. De fato, as chances de que esse processo fosse aprovado na Câmara dos Deputados (de maioria democrata) já eram tidas como altas e, portanto, sua confirmação não afetou os mercados significativamente. O processo seguirá agora ao Senado,  onde a maioria republicana na casa deverá arquiva-lo.

Na economia, os primeiros dados de dezembro não tiveram direção clara…. Nos EUA, os PMIs e os índices de atividade industrial apresentaram sinais mistos. No lado negativo, destacamos a piora do Empire Manuf. Index, enquanto que pelo lado positivo o PMI de serviços continuou avançando (gráfico 1). A pesquisa de confiança do consumidor (U. Michigan), por sua vez, também melhorou, atingindo o maior nível em 8 meses. Na Europa, os sinais também divergiram: de um lado o PMI da industria voltou a enfraquecer, enquanto a pesquisa Ifo de ambiente de negócios mostrou novo avanço. Neste caso, é justo dizer que o crescimento na Europa nos últimos meses parece ter se estabilizado após longo período de desaceleração. Uma preocupação a menos.

Gráfico 1: PMIs e índices de atividade industrial nos EUA

Fonte: Bloomberg e Versa Asset

Gráfico 2: PMI da industria (Europa) e pesquisa Ifo (Alemanha) 

Fonte: Bloomberg e Versa Asset

… e devem continuar “confusos” por algum tempo. Os indicadores de atividade nos EUA ficarão poluídos nos próximos meses devido a notícia de que a Boeing vai suspender parte de sua produção de aviões no 1º trimestre do ano. A decisão é relacionada aos problemas  técnicos com a aeronave 737 MAX, que levaram a dois acidentes graves este ano. Segundo o banco Morgan Stanley tal interrupção deve retirar 0,8 pontos percentuais do crescimento do PIB no 1º trimestre. Portanto, veremos números de atividade temporariamente fracos nos EUA nos próximos meses.

 

Brasil: recuperação segue, e mais cautela nos juros

Os dados do Caged de novembro foram bem mais fortes do que o esperado, apontando criação líquida de 99 mil postos de trabalho (ante expectativa de 50 mil). De fato, foi o melhor mês de novembro para criação de empregos desde 2010. Em termos dessazonalizados, estimamos um criação líquida de 90 mil empregos no mês. Se a criação de empregos seguir ritmo semelhante ao longo do próximo ano, isso seria condizente com um crescimento do PIB da ordem de 3.0-3.5% em 2020 (gráfico 3). Nada mal.

Gráfico 3: Relação histórica – média Caged 12m vs. cresc. PIB

Fonte: Caged e Versa Asset

As pesquisas de confiança de dezembro também foram animadoras para atividade. Como podemos ver no gráfico abaixo, praticamente todas as sondagens de confiança já divulgadas avançaram de maneira significativa. Dentre elas destacamos as sondagens da FGV para a indústria e o setor de construção. Ou seja, mais sinais de que a recuperação é relativamente generalizada entre os setores da economia.

Gráfico 4: Pesquisas de confiança no Brasil

Fonte: IBGE e Versa Asset

Na política monetária, o Copom demostrou mais cautela daqui em diante. A percepção foi a de que a ata da última reunião apontou menor propensão do comitê para reduzir os juros nas próximas reuniões. Em suma, o documento sugeriu certa preocupação dos diretores quanto ao riscos de que a capacidade ociosa da economia seja “preenchida” mais rapidamente do que os modelos sugerem, pressionando assim inflação. Além da ata, o Bacen divulgou seu relatório trimestral de inflação na quinta-feira. Suas projeções estiveram em linha com as já divulgadas na decisão do dia 11, apontando inflação abaixo da meta em 2020 e portanto, espaço para mais cortes de juros.

Gráfico 5: Projeções de inflação do Banco Central

Fonte: Banco Central (RTI)

Na inflação, o IPCA-15 de dezembro surpreendeu pra cima, essencialmente por alimentos. O indicador marcou inflação de 1.05% no mês, ante expectativas de 0.96%. No acumulado do ano, o IPCA-15 fechou em 3.91%. O preço da carne foi novamente o vilão, avançando 17.7%. Vale notar que tal choque também contaminou outros grupos além dos alimentos. Por exemplo, as medidas de inflação de serviço e núcleos também foram pressionadas (gráficos abaixo) devido aos reajustes nos restaurantes. Por esse choque, a expectativa é de que o IPCA termine o ano em torno de 4.3%, número bem acima do que se imaginava há apenas um mês atrás (3.3%). No entanto, notemos que a alta das carnes deve será revertida em grande parte ao longo de 2020. Ou seja, se o IPCA de 2019 será 1% mais alto do que se imaginava, o número de 2020 pode ser até 1% mais baixo do que se calculava se a alta das carnes for “devolvida” integralmente.

Gráficos 6, 7 e 8: Dados de inflação vs. padrão histórico no mês

Fonte: IBGE e Versa Asset
Fonte: IBGE e Versa Asset

E ai? Corta ou não corta? A depender estritamente das projeções de inflação do BC, haveria claro espaço para pelo menos mais um corte na Selic. De fato, o comitê estima inflação de 3.4% em 2020 em um cenário sem cortes adicionais na Selic e taxa de câmbio flutuando de R$4.15/US$ para U$4.10/U$ ao longo do ano. Caso a taxa de câmbio permaneça mais próxima dos U$4.00/U$  até a próxima reunião, a projeção de inflação do BC poderia ceder ainda mais. Somemos  a isso o efeito da provável “devolução” do choque da carne citado no parágrafo anterior, e a projeção do BC poderá caminhar para próximo de 3.0%, valor bastante abaixo da meta de 4.0%.

Vemos três riscos para a materialização deste cenário de cortes. O primeiro, naturalmente seria uma subida muito forte do dólar até lá, o que não parece estar no radar por enquanto. O segundo risco seria o de que o choque de alimentos não se reverta, ou mesmo se intensifique até fevereiro. Embora possível, também não parece tão provável. De fato, o risco que mais nos “preocupa” seria uma recuperação mais intensa da atividade econômica no início do ano, colocando dúvidas sobre a necessidade de mais estímulos. Por ora, ainda acreditamos em um corte de 0.25% na Selic em fevereiro, mas torcemos para estarmos errados pelo terceiro motivo!

 

 

 

 

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