Se ao longo de 2017 o ambiente econômico destoou da crise política, o setor automotivo foi um dos que mais sentiu a melhora. No acumulado do ano, as vendas de veículos aumentaram +9% comparado com o mesmo período do ano passado, e a produção recuperou mais rapidamente – subiu +29% sustentada pela demanda no mercado doméstico e pelo aumento de +58% das exportações. Se continuar nesse passo, o Brasil produzirá quase 2,8 milhões de veículos em 2017. É alto se comparado com os números durante a crise, mas ainda temos um caminho longo para atingir os recordes pré-crise. Para preencher toda a capacidade instalada o caminho é mais longo ainda, pois precisaríamos dobrar a produção local para chegar na capacidade anual de 5,6 milhões de carros.
Produção e Vendas de Veículos no Brasil 2002-2017Fonte: ANFAVEA. *dados de janeiro a outubro anualizados
A melhora de 2017 assusta frente um crescimento médio do PIB ainda abaixo de 1%, mas reflete uma dinâmica curiosa da indústria automotiva: sua enorme sensibilidade à renovação e crescimento da frota de veículos. Pela imensidão da frota, o coletivo de decisões de consumidores em trocar ou vender seu veículo impacta drasticamente o nível de demanda e produção doméstica.
O “efeito base” causa isso, pois a frota de 40 milhões de veículos é muito maior que a venda anual de 2.0 milhões. Cada 1% de motoristas que decidem trocar seu carro usado por um 0km, ou até mesmo comprar outro carro 0km, representa 20% da venda média anual dos últimos anos. O impacto é grande e, no momento atual de retomada da economia brasileira, gera uma ótima oportunidade de investimento.
As vendas domésticas representaram somente metade do aumento de produção de veículos esse ano. A outra metade veio da forte recuperação nas exportações. No acumulado do ano, já exportamos quase 628 mil veículos, número alcançado pela última vez em 2004. Profissionais da indústria automotiva apontam um câmbio desvalorizado e maior foco das montadoras em aumentar a utilização de capacidade no Brasil como propulsores desse crescimento. Dito isso, a exportação liquida é ~450 mil já que importamos alguns modelos não produzidos no país.
Exportação de Veículos no Brasil 2002-2017Fonte: ANFAVEA. *dados de janeiro a outubro anualizados
Na bolsa Brasileira, o setor automotivo é representado pelas empresas de autopeças (Iochpe-Maxion, Mahle-Metal Leve, Randon, Tupy) e pela Marcopolo, uma fabricante de ônibus. A crise que começou em 2014 trouxe um choque de realidade para essas empresas, que por anos aproveitaram de uma demanda forte e insustentável do mercado doméstico. Desde que foram retirados os subsídios públicos que incentivavam compra de carros e veículos pesados, a venda total de veículos caiu ~40%, forçando uma agenda de “reforma” nas montadoras e produtoras de autopeças, que fecharam unidades de produção, reduziram quadros de funcionários e cortaram custos. Hoje são mais enxutas e eficientes, e encaram uma retomada brusca de demanda.
Estimamos conservadoramente que o Brasil conseguirá sustentar crescimento médio anual de vendas de 3% entre 2018-2025. Tal crescimento seria maior no começo do período (+9% em 2018) e mais perto da taxa “normalizada” de crescimento de ~2% em 2025. Isso considera: (1) uma taxa média de renovação de frota de 3,5%; e (2) crescimento da frota médio de 2,0%. Ambas taxas são abaixo dos níveis pré-crise, para levar em consideração a falta de incentivos públicos para a compra de veículos. Se essas estimativas se concretizarem, chegaríamos em 2025 com vendas no mercado doméstico de quase 2,9 milhões de veículos. Assumindo exportações/importações e estoque estáveis, chegaríamos em 2025 com uma produção total de 3,3 milhões de carros. Ainda, o modelo é altamente sensível: pequenas melhoras nas premissas conservadoras acima causariam um impacto grande na produção.
Vendas de Veículos no Brasil 2009-2025 (Estimativa Versa Asset)
Nesse momento o efeito “alavancagem operacional” se faz presente. Com lucros ainda deprimidos, poucos aumentos de faturamento geram crescimento de lucro importante para as empresas de autopeças. Na disciplina de value investing que tanto prezamos na Versa Asset, chamamos isso de earnings momentum, efeito de custos comportados (ou caindo) e faturamento aumentando que engorda os lucros e a geração de caixa rapidamente.
Acreditamos que este seja o maior vetor de performance positiva para ações. No caso atual, enxergamos as maiores oportunidades na Iochpe-Maxion e Mahle Metal Leve, que juntas representam hoje ~20% da carteira do fundo Versa. Acreditamos que ambas ainda não precificaram adequadamente a melhora no ambiente de negócios para o setor de autopeças, além de suas próprias melhorias internas.
Seguimos investidos na tese de recuperação dos fundamentos econômicos do Brasil, diante de queda expressiva da inflação e juros, possibilitando crescimento do PIB de ~3% em 2018.
Disclaimer: As opiniões, análises e informações contidas nesse artigo não constituem recomendação de investimento, nem tampouco material de oferta para subscrição, compra ou venda de títulos ou valores mobiliários, instrumentos financeiros, cotas em fundos de investimento ou qualquer produto ou serviço de investimentos. Declarações contidas neste artigo relativas às perspectivas dos negócios, projeções de resultados operacionais e financeiros, bem como referências ao potencial de crescimento das companhias citadas, constituem meras previsões, baseadas nas expectativas do analista responsável em relação ao futuro. Essas expectativas são altamente dependentes de fatores incertos, como o comportamento do mercado, da situação econômica do Brasil, da indústria e dos mercados internacionais. Portanto, cada declaração aqui escrita está sujeita a mudanças, e não deve ser utilizada como insumo para qualquer estratégia de investimento pessoal ou institucional. A Versa Gestora de Recursos Ltda., seus sócios e colaboradores, por meio dos fundos de investimentos da casa, podem ou não estarem posicionados em títulos e valores mobiliários de emissores aqui mencionados, de forma que eventualmente influencie nas opiniões e análises aqui presentes.
Paulo, o crescimento dos veículos elétricos pode prejudicar estas empresas?
Olá Fernando,
Sim e não. A Iochpe produz rodas e componentes estruturais para veículos. Esses produtos não são ameaçados com o aumento da penetração de veículos elétricos. Já para a Mahle, traz uma ameaça de longo prazo. Seus produtos são para motores de combustão interna. A maioria dessas peças não são usadas no carro elétrico. Dito isso, A Mahle tem mudado seu posicionamento estratégico aos poucos para se adaptar. Sua controladora lá fora vem desenvolvendo tecnologia própria para carros elétricos, que caso necessário pode ser comercializados aqui no Brasil também no futuro. Localmente, a Mahle vem desenvolvendo tecnologia para carros híbridos a base de etanol. Estamos monitorando de perto. Caso a empresa não estiver preparada para as mudanças do futuro, podemos repensar o investimento.
Abraço,
Paulo
Obrigado pelo esclarecimento, Paulo.
Referente a MAHLE:
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O tema principal da palestra me diz muita coisa…
MAHLE in transition – shaping the future
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