A Semana Macro (29/03) – Juros, Assusta?

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A postura mais dura do BC na Selic não parece ter ajudado muito para aliviar as condições financeiras. Juros longos e câmbio seguem em alta. É seguro dizer que a piora da pandemia e da tensão política nas últimas semanas tem agravado os efeitos das questões econômicas nos prêmios de risco. Juros mais altos deveriam atrapalhar a recuperação econômica? Para este ano, acreditamos que não .Os riscos ficam muito mais por conta da pandemia e de uma deterioração ainda mais forte do cenário político. Seguimos construtivos com o crescimento.


Podemos dizer que a subida mais forte dos juros pelo BC surpreendeu o mercado duplamente. Em primeiro lugar, a decisão em si foi uma surpresa. Enquanto a maioria dos economistas (nós inclusos) esperava um ajuste  mais gradual na taxa Selic de 0.50% a.a, o Copom foi mais firme com 0.75%. Segundo o comitê, pesaram na decisão o cenário externo mais desafiador, a recuperação mais forte da atividade nos últimos meses (e portanto, menos capacidade ociosa), o risco da inflação deste ano acabar rompendo o teto da meta (5.25%) e uma possível desancoragem das expectativas de inflação de 2022 em diante. Ou seja, a ideia seria que subir os juros mais rapidamente em um primeiro momento serviria tanto para acelerar o efeito de juros mais altos na inflação deste ano quanto para demostrar redobrado comprometimento com as metas de longo prazo.

No linguajar de mercado, o BC estaria sendo “Hawkish”. A teoria econômica diz que em condições onde os juros estão muito baixos (como é o caso agora) esta postura traria suas consequências nos preços de mercado. Uma delas seria a de um “achatamento” da curva de juros. Ou seja, com perspectivas de juros mais altos no curto prazo, os mercados passariam a precificar menor necessidade de aumentos em horizontes mais longos. Outro efeito seria na taxa de câmbio: com uma postura mais dura nos juros normalmente vem a valorização da moeda.

No entanto, não foi isto que vimos após a decisão do Copom, e daí a segunda surpresa. Os juros e o câmbio até se comportaram como esperado no dia seguinte, mas não durou muito. A alta dos prêmios de risco voltou a dominar nos últimos dias. Nos juros, a curva precifica como praticamente certo um aumento de 1.0% da Selic na próxima reunião. Isto a despeito do próprio BC ter sinalizado explicitamente que pretende  aumentar em apenas 0.75% e que as coisas precisariam piorar significativamente para acelerar o passo. Os juros longos, por sua vez, estão próximos das máximas desde o início da pandemia. No câmbio, somos novamente a moeda emergente com pior desempenho este ano. O stress não é pequeno.

Gráfico 1: Valorização das moedas emergentes em 2021 (%)

Fonte: Bloomberg

Parece claro que as causas da volatilidade vão além dos aspectos estritamente econômicos apontados pelo BC. Subida de juros nos EUA, atividade mais forte por aqui e números mais salgados de inflação certamente importam mas não deveriam justificar tamanho descolamento dos prêmios de risco em relação a outros países emergentes. Neste caso, é seguro dizer que a piora da pandemia e da tensão política nas últimas semanas tem agravado os efeitos das questões econômicas nos prêmios de risco.

Sobre o cenário econômico, não temos muito o que discordar em relação à visão consensual,  exceto pelo crescimento deste ano. Seguimos mais otimistas. No curto prazo esperamos um impacto relativamente menor do isolamento na atividade econômica. Nossas estimativas em tempo real para o PIB do 1º trimestre ainda apontam crescimento na margem, muito ajudado pelos investimentos e o setor industrial. Para o 2º tri certamente haverá contração no PIB, mas acreditamos em uma forte retomada da atividade a partir de maio ou junho com a intensificação da vacinação e seu efeito nas curvas de hospitalizações e óbitos. Além disso, nossa impressão é de que a maioria dos economistas tem dado peso relativamente pequeno ao efeito positivo da aceleração da economia mundial no crescimento interno. Hoje nossa projeção para o PIB deste ano está em 4.2%, ante 3.2% no relatório Focus. Na verdade, com mais segurança sobre a melhora da pandemia estaríamos tentados a esperar um crescimento ainda maior.

Juros mais altos deveriam atrapalhar a recuperação econômica? Depende de qual horizonte estamos falando e do que entendemos como “altos”. Para este ano, dificilmente uma subida mais forte de juros teria tempo para atrapalhar a atividade. Os riscos para o crescimento ficam muito mais por conta da pandemia (vacinas se mostrarem ineficazes para novas cepas, por exemplo) e de uma deterioração ainda mais forte do cenário político. Para 2022, juros de 6% ou 7% ainda seriam considerados baixos historicamente e não deveriam atrapalhar muito a recuperação. Novamente, o risco fica com o cenário político.








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