Sem outras novidades no plano global, o surto de corona vírus pesou nos mercados durante a semana. No Brasil, alguma positividade com a atividade e sentimentos mistos com a inflação. Mesmo assim, consolidou-se a visão de que mais cortes nos juros vêm por aí.
Mundo: Atenções voltadas à China
O corona vírus começou a preocupar, e pode impactar a economia chinesa. Em uma agenda econômica esvaziada na semana, as atenções globais ficaram voltadas ao surto da doença. De fato, o número de casos confirmados na China cresceu de maneira exponencial durante a semana: foram de 120 para 2.5 mil até a noite deste domingo, somando 80 mortes. O episódio tem sido comparado ao surto da SARS, ocorrido em 2002, onde 5.3 mil pessoas foram infectadas na China e 350 morreram. Na época, a doença teve um impacto negativo de cerca de 1% no PIB chinês. Nessa linha, a cautela imperou nos mercados globais, com a maioria das bolsas fechando em baixa na semana. Vale destacar a forte queda dos preços do petróleo (gráfico abaixo), refletindo os temores de desaceleração do consumo na China.
Gráfico 1: Preço do petróleo (WTI US$/barril)
Brasil: Atividade melhora; sinais mistos na inflação
Os dados de atividade pararam de assustar e voltaram a apontar recuperação, após uma sequência de surpresas negativas nas últimas semanas. O destaque ficou com a pesquisa do CAGED de dezembro, mostrando redução líquida de 307 mil postos de trabalho formais, ainda assim, melhor do que o esperado pelos economistas (-324 mil). Vale notar que dezembro possui sazonalidade muito negativa devido ao fechamento das vagas temporárias do natal. Fazendo o ajuste pela sazonalidade, foram na verdade criadas cerca de 70 mil vagas no mês. Um pouco menos do que em novembro (87mil) e outubro (76mil), mais ainda acima da média. Visto que o emprego formal tem forte correlação com o PIB, o gráfico abaixo mostra os dados do CAGED “traduzidos” em termos de crescimento do último. O número de dezembro seria condizente com crescimento de 2.5% ao ano. Nada mal.
Gráfico 2: Cresc. do PIB (anualizado) condizente com resultados do CAGED
Por outro lado, as prévias das sondagens de confiança não foram tão claras. Enquanto a pesquisa da indústria mostrou leve alta em janeiro, a do consumidor recuou um pouco (gráfico abaixo). Aqui valem duas considerações. A primeira é de a que a confiança do consumidor provavelmente foi afetada pela alta recente do preço da carne e, portanto, deve melhorar conforme os preços caiam (o que já começou a acontecer). Em segundo lugar, a confiança da indústria é mais aderente com a atividade econômica no curto prazo do que a pesquisa do consumidor. Com tudo isso na conta, o balanço parece ter sido positivo para atividade econômica. Nossa projeção em tempo real para o PIB do 4º tri seguiu em torno de 0.6% QoQ. A boa notícia ficou com a projeção do 1º tri (ressalta-se, ainda muito preliminar) subindo de 0.3% para ~0.5% ao longo da semana.
Gráfico 3: Pesquisas de confiança (prévias)
A inflação mostrou sinais mistos. Ou seja, embora o número do IPCA-15 de janeiro tenha vindo dentro do esperado (0.71% MoM), houve surpresas negativas e positivas na quebra dos dados. Do lado positivo, parece que a reversão do preço das carnes chegará ao consumidor um pouco antes do esperado. A inflação de carnes cedeu rapidamente para “apenas” 4.8% no mês, ante 18% há duas semanas, e deve se transformar em queda de preços muito em breve. Por outro lado, a inflação de serviços e os núcleos (medidas de inflação olhadas atentamente pois tentam excluir o efeito direto de choques passageiros, como o da carne) voltaram a subir, como visto no gráfico abaixo. O problema é que tais medidas não excluem os efeitos indiretos da alta da carne como, por exemplo, nos reajustes dos restaurantes.
Gráfico 4: Núcleos de inflação (MM3M, ajustada sazonalmente e anualizada)
Mesmo assim, mais cortes de juros devem vir. De fato, a despeito do panorama levemente mais positivo para a atividade e de algum alerta com a inflação, a visão de que há espaço para pelo menos mais um corte da Selic se consolidou no mercado. Na sexta-feira a curva de juros precificava probabilidade próxima de 100% de mais um corte de 0.25%. Nesse sentido, a entrevista do presidente do Banco Central ao Valor Econômico ajudou. Ao tratar da inflação, a matéria indicou conforto em relação aos números recentes, o que sugeriria espaço para mais cortes de juros. Por ora, mantemos nossa visão de apenas um corte de 0.25%. Entendemos que cortes adicionais exigiriam uma frustração mais intensa com a recuperação econômica, o que ainda não parece ser o caso.
O que devemos ficar de olho nessa semana?
Agenda cheia lá fora… Além dos desdobramentos do surto de corona vírus, o mercado estará atento a decisão de política monetária do Fed na quarta-feira. Os dados de PIB do 4º tri dos EUA serão divulgados na quinta-feira e os da Europa na sexta-feira. Na quinta-feira também teremos o PMI da indústria na China.
… e aqui dentro também. Foco na atividade econômica, com os dados de crédito (quarta-feira), emprego e renda (sexta-feira) e as leituras finais das pesquisas de confiança do setores de serviços, construção civil e indústria ao longo da semana. Além disso, os dados fiscais de dezembro serão publicados na quarta e sexta-feira.