Mundo: Epidemia “sob controle” e dúvidas quanto à recuperação
Na epidemia, os números nos países desenvolvidos continuaram a animar, apontando estabilização ou queda no número de mortes. Na Europa, enquanto Itália e Espanha tem estabilizado suas mortes na casa das 500 por dia, as ocorrências na França começaram a se reduzir bem como no Reino Unido. Nos EUA, por sua vez, além de o número de mortes diárias começar a dar sinais de melhora, a quantidade de pacientes hospitalizados na cidade de Nova Iorque, principal epicentro da doença, tem caído nos últimos dias. Neste sentido, medidas de afrouxamento gradual dos lockdowns foram anunciadas nestes países.
Gráfico 1: Mortes diárias por Covid-19 e linhas de tendência
Na economia, os dados de atividade da China foram o destaque, e não animaram muito. O PIB do 1º trimestre recuou 6.8% YoY (ou seja, em relação ao 1º tri do ano passado), valor próximo da expectativa média dos economistas. Vale lembrar que o PIB por lá estava crescendo 6% até o final do ano passado, então o tombo foi grande. Embora o governo não divulgue dados de crescimento QoQ, estimamos que a queda tenha sido de aproximadamente 11% em relação ao 4º tri do ano passado. Certamente a queda mais forte da história até então.
Gráfico 2: Crescimento do PIB trimestral na China (YoY%)
No entanto, o que mais chamou a atenção por lá foram os dados mensais de produção industrial e varejo de março. Talvez estes possam indicar como será em outros países daqui em diante. Por um lado, a produção industrial surpreendeu positivamente ao cair “apenas” -1.1% YoY (ante uma queda de -13.5% janeiro e fevereiro), apontando uma forte recuperação na margem. Por outro lado, as vendas do varejo decepcionaram ao recuarem -15.8% YoY (ante -20.5% em jan. e fev.). Ou seja, aparentemente a oferta tem se recuperado de forma mais rápida do que a demanda. O que parece fazer sentido. Embora os estímulos econômicos (crédito abundante, subsídios, etc) sejam capazes de manter as empresas produzindo, as regras de distanciamento e o medo do vírus fariam as pessoas consumirem menos. Ao menos que se ache um tratamento ou vacina totalmente eficaz, isso não deveria mudar tão cedo e dificultaria uma retomada completa da economia.
De fato, é razoavelmente consensual a visão de que a retomada não será tão rápida na maior parte dos países. Neste sentido, as projeções oficiais do FMI publicadas na semana passada apontam para uma queda de 6.1% no PIB dos países mais ricos este ano seguida de uma alta de apenas 4.5% em 2021 (portanto, ainda abaixo dos níveis pré-crise). Nos países emergentes o otimismo ficaria só com a China, Índia e outros asiáticos. Nas contas do FMI, o PIB do Brasil cairia -5.3% este ano mas subiria só 2.9% ano que vem, não muito pior do que toda a América Latina (-5.2% e +3.4%).
Gráfico 3: Projeções de crescimento do PIB segundo o FMI
Vale lembrar que embora as projeções do FMI costumem refletir a visão “média” do mercado, há ainda muita dispersão nas estimativas. Usemos o caso dos EUA como exemplo. O Wall Street Journal publica mensalmente uma pesquisa parecida com o nosso relatório Focus, só que com a diferença de que as projeções de cada participante são conhecidas. No gráfico abaixo vemos as projeções para crescimento do PIB este ano, em ordem decrescente. Embora a mediana destas seja -4.4%, há gente esperando quedas bem menores, ou mesmo tombos de 10% ou além.
Gráfico 4: Projeções de cresc. do PIB nos EUA para 2020
Olhando à frente, a maioria dos analistas espera que a economia americana se normalize apenas no fim de 2022. O gráfico abaixo, com os dados da mesma pesquisa, mostra as expectativas para a evolução da taxa de desemprego. A linha verde se refere a mediana das expectativas na pesquisa de abril para até 2023. A área em torno mostra a dispersão das mesmas no intervalo 15%-85%. Na linha cinza estão as medianas da pesquisa de janeiro. Ou seja, a taxa de desemprego só voltaria pra o cenário “pré-corona” daqui pelo menos 2 anos. Uma recuperação relativamente lenta.
Gráfico 5: Projeções de taxa de desemprego nos EUA
Mesmo com um cenário tão incerto, valem algumas colocações sobre estas expectativas. A primeira é a de que os cenários estão sendo desenhados com o que temos – ou melhor, o que não temos – hoje. Ainda não há vacina nem consenso sobre algum tratamento altamente eficaz. Por outro lado, estudos seguem avançando em dezenas de frentes. Talvez seja seguro dizer que nunca houve tanta gente no mundo tentando resolver um mesmo problema ao mesmo tempo.
A segunda é a de que também não há precedentes quanto à quantidade de estímulos sendo colocada pelos governos. Nos EUA, entre gastos fiscais, linhas de financiamento e programas de compras de ativos já se vão 30% do PIB. E podem aumentar. Diferente das crises anteriores onde os culpados eram humanos, desta vez não há a preocupação de que estímulos possam incentivar comportamento irresponsável no futuro. A quantidade destes estímulos será limitada apenas pela capacidade que cada país tem em implementá-los. Capacidade esta relativamente mais alta em países desenvolvidos e com moeda forte.
Se dinheiro não vai faltar, dizer para onde ele irá pode ser mais difícil. Nada garante, como já dissemos, que as pessoas voltem a consumir como antes ou que as empresas retomem seus planos de investimento. Neste sentido, a recuperação seria realmente mais lenta. Se no entanto o interesse for nos preços dos ativos, a pergunta pode ficar um pouco mais fácil. Afinal, bolsa não é PIB. Há outros fatores importantes além do crescimento para explicar seu comportamento. Um deles são os juros e a oferta de moeda na economia. Se a expansão monetária não for para o consumo e investimento produtivo, irá para a compra de ativos já existentes, inflando seus preços.
Outro fator a ser considerado é o ambiente competitivo que as empresas terão daqui em diante. Infelizmente, empresas menores devem ter mais dificuldade para sobreviver sem receitas por alguns meses. Na outra ponta, as maiores empresas com melhor capacidade de se financiar irão passar pela crise em melhores condições para ganhar market share em um segundo momento. Nesta linha, as empresas da bolsa (maiores) tenderiam a ir melhor do que o agregado da economia (o PIB).
Brasil: Mais sinais de desaceleração
Na economia, os indicadores seguem confirmando forte retração da atividade. O destaque na semana ficou com as prévias das sondagens da FGV, todas apontando uma queda sem precedentes dos níveis de confiança. Por ora, nosso palpite é de um recuo de aproximadamente 5% no PIB este ano, com algum viés para baixo neste número.
Gráfico 6: Indicadores de confiança nas sondagens da FGV