Em uma semana sem muita direção no plano global, os fracos números de atividade interna voltaram a pesar. Lá fora, enquanto o coronavírus seguiu no foco, a economia americana deu alguns sinais de desaceleração, mas nada que preocupe por enquanto. No Brasil, os dados de varejo e serviços confirmaram um cenário de recuperação mais lenta do crescimento. De fato, essa dinâmica associada a queda das projeções de inflação tem fortalecido a visão de que os juros permanecerão baixos por mais tempo.
Mundo: Coronavírus no foco e crescimento mais fraco nos EUA
Continuam as preocupações com o Coronavírus. Até a noite deste domingo, os casos confirmados seguiam em mais de 70 mil (1,700 mortos) sem sinais muito claros de desaceleração. De fato, apenas na província de Hubei (epicentro da epidemia) foram registrados 1,900 novos casos no domingo. O lado positivo é que a epidemia permanece relativamente contida a aquela região, sem crescimento acelerado em outras províncias ou países. Talvez por isso boa parte dos mercados seguiram em alta, com destaque para as bolsas americanas, com o S&P 500 renovando suas máximas históricas.
Nos EUA, atividade levemente mais fraca. O ânimo da bolsa americana na semana não pôde ser atribuído a indicadores econômicos mais fortes. De fato, a produção industrial de janeiro, registrou queda de -0.3% M/M. Esta redução já era esperada, por conta da interrupção da fabricação dos aviões 737-max da Boeing anunciada em Dezembro. Outro dado relevante foram as vendas do varejo de janeiro, que avançaram +0.3%. Embora o número tenha vindo em linha com o esperado, sua composição na agradou tanto (o chamado “grupo de controle” das vendas, utilizado no cálculo do consumo do PIB, ficou em 0%), além de o crescimento de dezembro ter sido revisado para baixo (de +0.5% p/ +0.2%). Com tudo isso na conta, nossa projeção em tempo real para o crescimento do PIB do 1º tri recuou de 2.0% para 1.76% QoQ anualizados, o que não deixa de ser um crescimento forte.
Gráfico 1: Projeção em tempo real do PIB 1º tri 2020 (QoQ saar) nos EUA
Brasil: cautela com o crescimento e expectativas de inflação em queda
Os dados do varejo e serviços de dezembro desanimaram… Na pesquisa mensal do comércio do IBGE, as vendas vieram abaixo do esperado, registrando quedas de -0.1% M/M no conceito restrito e -0.8% no conceito ampliado (que inclui material de construção e veículos). Mesmo que parte da queda possa ser atribuída à alta temporária da inflação, o dado foi inequivocadamente fraco, indicando contração na maioria das categorias. De fato, a pesquisa de serviços também desanimou ao recuar -0.4% M/M, sem falar da produção industrial divulgada na semana anterior, que caiu -0.7%. Ou seja, a fraqueza da atividade econômica em dezembro foi generalizada. Vale notar que por conta dos dados mais fortes em outubro e novembro, o PIB do 4º tri não deve ser tão ruim assim. Estimamos crescimento de +0.6% QoQ, idêntico ao 3º tri.
Gráfico 2: Dados de atividade mensal (base jan/14=100, sa)
… e a atividade no 1º tri também não deve brilhar. Em primeiro lugar, embora os dados preliminares de janeiro não apontem queda da atividade, o crescimento sugerido não tem sido suficiente para compensar a decepção de dezembro. Neste sentido, os destaques da semana ficaram com o fluxo de tráfego pedagiado e a expedição de papel ondulado de janeiro. Incorporando essas variáveis, nossa estimativa em tempo real para o PIB do 1º tri se manteve essencialmente inalterada em relação a semana anterior, apontando crescimento entre 0.3% e 0.4% QoQ. Em segundo lugar, vale lembrar que esta estimativa não embute os possíveis impactos do coronavirus em certos setores, onde as evidências são, por ora, anedóticas. Ou seja, parece razoável esperar algo abaixo de 0.3% no 1º tri.
Gráfico 3: Projeção em tempo real do PIB 1º tri 2020 (QoQ sa) no Brasil
As expectativas de inflação continuaram (e devem continuar) a cair. Na segunda-feira passada, o relatório Focus apontou nova redução das expectativas para o IPCA de 2019, de 3.40% para 3.25%. Em nossa visão, ainda há espaço para que estas continuem a cair. De fato, não parece difícil imaginar inflação abaixo de 3.0% se levarmos em conta os diversos vetores negativos para o IPCA deste ano. Entre eles, estão as reversões esperadas nos preços da carne, da energia elétrica e dos combustíveis. A thread abaixo, que escrevemos no Twitter, detalha alguns destes pontos:
Não por acaso, os juros seguiram em baixa. Com mais cautela na atividade e expectativas de inflação em queda, a curva de juros continuou a reduzir seus prêmios na parte mais curta. Por exemplo, a taxa para Janeiro de 2022 encerrou a semana com queda de 25bps, em 4.71% a.a. Por ora, não esperamos mais cortes da Selic este ano, mas acreditamos que a elevação dos juros ocorra de forma bastante gradual, começando apenas no segundo semestre de 2021.
No que devemos ficar de olho durante a semana?
Atividade econômica nos EUA. Os primeiros dados de atividade referentes a fevereiro serão conhecidos com a Empire State Survey na terça-feira, a Philadelphia Fed Survey na quinta-feira e os Markit PMIs na sexta-feira.
IPCA-15 e pesquisas da FGV no Brasil. Na quinta-feira, há duas questões para o IPCA-15 de fevereiro responder. A primeira é se haverá intensificação do ritmo de queda nos preços da carne. A segunda é se a queda inesperada dos itens de higiene pessoal no IPCA de janeiro foi apenas ruído ou de fato um choque permanente. Além disso, ao longo da semana serão conhecidas as prévias das sondagens setoriais da FGV para fevereiro.