A Semana Macro (16/03) – Coronavírus e a Política Fiscal

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Na semana mais volátil da crise até agora, a política fiscal ganhou destaque. Nos EUA, o governo finalmente reconheceu a gravidade da epidemia e lançou suas primeiras medidas de estímulo, o que agradou os mercados. No Brasil, a hesitação do governo em seguir a mesma direção parece ter suas razões. Em um contexto de crescente distanciamento do Congresso, os riscos de perder o controle da agenda fiscal não são baixos, como a derrubada do veto ao BPC já indicou. Na política monetária, continuamos céticos de que a Selic cairá muito, não propriamente pelas projeções de inflação e atividade, mas pelos riscos de mais depreciação no câmbio, intensificado por um cenário de expansão fiscal.

O coronavírus e as medidas fiscais

O coronavírus seguiu avançando no mundo…. A epidemia seguiu crescendo em velocidade geométrica em vários países, com destaque para a Europa e EUA. A boa notícia ficou na Asia, onde o crescimento da doença segue controlado não só na China, mas também na Coréia do Sul e no Japão. O sucesso nestes dois últimos casos é especialmente valioso, pois sugere que a combinação de testes em massa com medidas organizadas de distanciamento social são eficazes para manter o crescimento da doença em ritmo administrável e evitar o colapso do sistema de saúde.

… e as medidas de estímulo começaram a aparecer.  A maioria dos países afetados pela epidemia anunciou pacotes econômicos  para amenizar os efeitos da crise e prover recursos ao sistema de saúde. Nos EUA, o governo finalmente reconheceu a gravidade da epidemia e lançou suas primeiras medidas de suporte na sexta-feira, o que agradou os mercados. 

Certamente outras medidas virão, mas com escopos diferentes. De fato, há um crescente debate entre os economistas sobre como as medidas de estímulo para a atual crise deverão ser distintas das políticas clássicas de estímulo fiscal. Pra ficar no exemplo mais óbvio, qual seria a utilidade de estimular o consumo via cortes de impostos se o objetivo é justamente manter os consumidores em casa? O foco, na verdade, deveria ser em criar mecanismos de proteção para que empresas não quebrem e famílias não passem dificuldades por conta da queda temporária (e inevitável) da atividade. Entre possíveis medidas, podemos citar subsídios do governo para licenças remuneradas , criação de linhas especiais de crédito e adiamento do pagamento de impostos para as empresas dos setores mais afetados.

Professor Ricardo Reis (LSE) sobre políticas fiscais na crise

Vale notar que quanto mais focadas forem tais medidas, mais simples politicamente será retirá-las quando a situação se normalizar. Afinal, há um risco concreto de que o coronavírus seja usado como desculpa para que governos aumentem permanentemente seus gastos. Quanto mais difusas forem as políticas de estímulo, mas fácil será achar uma razão qualquer para mantê-las. Uni-se a fome com a vontade de comer. 

No Brasil, poucas pistas do que vem por aí. Por ora, o governo tem hesitado em anunciar medidas econômicas para a crise. De fato, o discurso ainda tem sido na linha de que as reformas seriam a melhor resposta. Para ser justo esta hesitação tem suas razões. Em primeiro lugar, se ainda não há clareza de como a epidemia irá se comportar no Brasil (clima tropical ajuda?), há menos ideia ainda sobre seu impacto econômico para que medidas focadas sejam anunciadas. Em segundo lugar, na última semana a equipe econômica ficou mais preocupada em desarmar uma bomba fiscal vinda do Congresso do que pensar em coronavírus. A ampliação do BPC pode gerar um impacto de R$12 bilhões por ano segundo estimativas do banco Itaú, (os R$20bi anunciados pelo governo parecem exagerados).

Se o governo não liderar, será liderado. No atual contexto de tensão política não podemos descartar a possibilidade de o governo perder o controle da “pauta do coronavírus” para o Congresso. Nesta hipótese, provavelmente veríamos medidas desencontradas e de eficiência duvidosa sendo aprovadas. Este parece ser o principal risco político/fiscal para os próximos meses. 

Perspectivas para os juros

Lá fora, bancos centrais seguiram provendo liquidez. Na Europa, embora o ECB não tenha cortado os juros (já estão negativos em -0.5%) anunciou o aumento do seu programa de compras de ativos além de medidas especificas para suportar o crédito bancário. Nos EUA, entre outras medidas  o Fed anunciou na noite de domingo uma redução emergencial das taxas de juros para o intervalo de 0-0.25% além de um programa de compra de U$700 bi em ativos. A medida foi seguida de uma ação coordenada de outros bancos centrais também no sentido de prover liquidez ao sistema.

E no Brasil? O que esperar para a Selic? Com o Fed e outros grandes BC afrouxando suas condições monetárias, seria natural imaginar que o Bacen seguisse o mesmo caminho. De fato, muitos economistas tem defendido cortes rápidos da Selic, algo como 0.75%, ou até mais, na reunião desta quarta-feira. Nesta linha, o Bacen deveria acelerar o ritmo de venda de reservas cambiais para evitar depreciação excessiva do Real. Somos céticos em relação a essa estratégia, e aqui valem algumas considerações. Em primeiro lugar, uma queda forte da Selic pouco ajudaria na recuperação da atividade econômica. Como argumentamos, políticas de expansão fiscal deverão ser implementadas no mundo, e o Brasil não fugirá a regra. Como serão essas políticas e quais seus custos? Qual o risco de o governo perder o controle dessa agenda? Neste contexto, corte de juros poderiam aprofundar a deterioração dos prêmios de risco. Em segundo lugar, não se sabe a extensão e duração da crise, e portanto, até quando o Bacen seguiria vendendo suas reservas para defender certa taxa de câmbio.

Por ora, vemos um corte de 0.25% na Selic esta semana como caminho mais prudente e provável. Não cortar nada também parece uma opção viável, mas menos provável em nossa opinião.