A Semana Macro (12/07) – Se Crescer, Não Se Empolgue!

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Embora o crescimento tenha surpreendido muito este ano, somos bem mais cautelosos com 2022. O preço das commodities deve se reverter em parte, as políticas monetária e fiscal serão mais restritivas e há riscos como o do racionamento e incertezas nas eleições, o que pode frear um pouco a atividade. Neste cenário, temos dificuldade em imaginar que a Selic suba tanto quanto o mercado precifica. Fazendo a história um pouco mais longa:



Parece que mais revisões de PIB vem por aí. A julgar pelos dados recentes de atividade, é bem provável que o impacto da 2a onda não tenha sido tão forte quanto esperavam os economistas e que o PIB do segundo semestre volte a surpreender. Já a partir de maio temos visto melhora dos indicadores de mobilidade, da indústria, mercado de trabalho formal, arrecadação de impostos, pesquisas de confiança, do comércio e do setor de serviços.

Com tudo isso na conta, nossos modelos têm sugerido um crescimento em torno de 1% no 2º trimestre em relação ao primeiro. Como a maioria dos economistas tem falado em algo entre 0% e 0.5%, daí viria o espaço para revisões de alta no PIB de 2021, cujas previsões do relatório Focus ainda estão em 5.3%. Se há um mês falávamos em crescimento de 5.5%, hoje nossa cabeça está nos 6%. Embora um crescimento de 7% nos pareça mais improvável, não seria um despautério imagina-lo com uma boa dose de sorte. Mais incrível é lembrar que até o final de abril a maioria dos analistas projetava crescimento próximo de 3%.

Contudo, seguimos mais cautelosos com 2022. Esperamos crescimento em torno de 1.5%, um pouco menor que os 2.1% na mediana do Focus. Há algumas razões para esta cautela. A primeira é naturalmente lembrar que a maior parte do crescimento de 2021 se deve à base muito fraca de 2020 e que portanto uma desaceleração para 1.5% em 2022 não seria tão brusca quanto parece. A maneira mais clara de olhar isto é a de considerar o ritmo médio de crescimento do PIB trimestral (em relação ao tri anterior) daqui em diante. Trabalhamos com um crescimento médio de 0.6% na segunda metade deste ano, ainda ajudada pela gradual reabertura da economia. Para 2022 esta média de crescimento trimestral ficaria em 0.3%. Ou seja, a desaceleração não seria tão drástica assim.

Pensando em fatores propriamente econômicos, 2022 pode decepcionar justamente pelos motivos que fizeram (e ainda estão fazendo) 2021 surpreender positivamente. O mais claro é o efeito da dinâmica dos preços internacionais de commodities sobre a atividade. Se pudéssemos eleger o gráfico mais subestimado da economia brasileira seria este logo abaixo. Nós o chamamos carinhosamente de gráfico da “República das Bananas”. Vemos a correlação impressionantemente alta entre as flutuações/ciclos dos preços de commodities e o crescimento do PIB brasileiro. A crise de 99, o boom econômico da era Lula, a crise de 2015 e impeachment, todos estes eventos parecem andar juntos em algum grau a estas flutuações. A forte recuperação deste ano não seria diferente.

Gráfico 1: Crescimento do PIB do Brasil e variação do preço das commodities (var% 12m acumulada)

Fonte: Versa Asset

Nas linhas tracejadas estão nossa projeção oficial para o PIB até o fim deste ano (6%) e um exercício simples supondo que os preços de commodities fiquem constantes no patamar atual até dezembro. Projetando uma curva na outra (crianças, não façam isto em casa!!) chegaríamos a um crescimento do PIB de 8% este ano. Obviamente este tipo de análise é excessivamente simples para ser chamado propriamente de previsão, mas reforça o ponto de que o PIB pode continuar surpreendendo nos próximos meses.

Se as commodities estão ajudando tanto este ano, o que esperar para 2022? Teríamos entrado em um superciclo de commodities como aquele da era Lula com implicações para nosso crescimento nos próximos anos? Temos dificuldade em acreditar nisto por enquanto. Ao que parece, boa parte da alta recente nos preços está ligada a gargalos transitórios de oferta e aumento temporário de demanda causados pela pandemia. Embora tais choques tenham se mostrado mais duradouros do que se esperava, é difícil imaginar que se mantenham ainda no próximo ano. Se a alta desses preços ajudou a economia em 2021, sua reversão mesmo parcial deveria atrapalhar em 2022.

Além do empurrão das commodities, 2021 sentiu os efeitos de um nível sem precedentes de estímulos da política monetária . Para 2022 provavelmente não teremos esta alavanca a ajudar no crescimento. Explica-se. Embora a Selic já tenha começado a subir este ano, os canais de transmissão dos juros para a atividade operam com certa defasagem (cerca de 6 meses) e também é preciso descontar a inflação ( são os juros reais que importam), que por sua vez subiu fortemente nos últimos meses. Ou seja, os cortes de juros do ano passado estão sendo sentidos agora.  Esta mesma subida da inflação tem levado o BC a rever sua estratégia de juros e há certo consenso de que a Selic atingirá algo próximo de 6.5% já agora em outubro. Este seria o tal nível “neutro” de juros, onde estes não mais ajudariam a estimular a economia.

Pelo lado da política fiscal, o crescimento no próximo ano também não tem muito por onde ser ajudado. Em 2021 foram até agora aprovados cerca de 120 bilhões em despesas extraordinárias (ou seja, que estão fora do teto dos gastos) para o combate à pandemia e seus efeitos econômicos. Aí estão inclusos o auxílio emergencial, as medidas de proteção ao emprego, e outras ajudas a empresas. Muito provavelmente estas despesas não serão estendidas no ano que vem. Para 2022 a expansão prevista no limite do teto dificilmente acomodará algo além de R$25 bilhões a serem utilizados para turbinar o bolsa família, como já anunciado pelo governo. Ou seja, em termos reais teríamos  uma redução líquida de R$95 bilhões nos gastos totais de um ano para outro. Isto naturalmente seria um detrator para a atividade econômica em 2022.

Por fim, há riscos para 2022 que não merecem ser descartados. Recentemente cresceram as preocupações com o cenário hídrico, ensejando a possibilidade ainda remota de racionamento energético neste ou no próximo ano. Pelo o que temos ouvido dos especialistas, a chance de um racionamento no sentido literal realmente é muito baixa, mas parece já ser um fato consumado que os preços de energia seguirão bem acima da média histórica por um período relativamente prolongado. Somando a isso, há o risco eleitoral. Nos parece ingênuo traçar cenários por enquanto, mas nossa impressão é a de que as forças políticas caminharão de alguma forma para o centro. Contudo, a volatilidade destes cenários até lá podem impor alguma cautela nas decisões de investimento das empresas.

Com a atividade desacelerando em 2022, os prêmios de risco embutidos atualmente na curva de juros curta nos parecem bastante elevados. Hoje o relatório Focus projeta Selic de 7% no final de 2022 e a curva embute algo próximo dos 8.5%. Em nossa visão é bem provável que a Selic chegue a 6.5% já nos próximos meses como forma de manter as expectativas de inflação ancoradas. No entanto, temos muita dificuldade em imaginar que os juros passem muito disso (ou seja, se tornem “oficialmente” restritivos para a atividade) no cenário descrito acima. Ademais, nos parece concreta a possibilidade de cortes de juros ao longo de 2022 se o cenário político não se deteriorar sobremaneira. Em nossa visão, o legado do covid na economia se provará desinflacionário no médio/longo prazo.














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