Subir 100% é mais difícil do que cair 50%?

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Existe uma crença entre investidores de que quando há uma perda em um investimento o movimento de recuperação dessa perda é mais difícil, pois o ativo terá que subir mais do que ele caiu. Por exemplo, imagine que você comprou uma ação por R$10,00 e sofreu uma perda de 50%. A ação passou a valer R$5,00, e a partir daí, para recuperar o valor ela teria que subir 100% (em oposição aos 50% de queda) para retornar aos R$10,00 iniciais. Mas será que é verdade que é mais difícil subir 100% do que cair 50%? Nós discordamos dessa visão. Explicamos abaixo.

A matemática parece menos cruel quando dividimos o movimento em mais passos

Apesar de grandes movimentos de retorno como os mencionados acima serem comuns no mundo dos investimentos, eles dificilmente ocorrem do dia para noite. Na realidade, os movimentos são espalhados ao longo de vários dias, meses e as vezes até anos. Devido a natureza exponencial dos retornos, a composição de pequenos movimentos ao longo dos dias gera um resultado bem maior. Se dividirmos esses grandes movimentos em pequenos movimentos diários, veremos que a discrepância entre os retornos positivos e negativos são bem menores do que parecem no exemplo acima. Se dividirmos o movimento em 5 passos por exemplo, o retorno diário negativo teria que ser -12,94% enquanto o positivo teria que ser +14,87% ao dia, uma diferença bem menor. Se aumentássemos para 1000 passos, ambos teriam que ser em termos absolutos 0,07%, ou seja, não haveria diferença. Para ilustrar melhor deixamos abaixo as tabelas comparando os retornos de acordo com o número de dias do movimento.

Uma conta alternativa: log-retornos

A conta do retorno linear é muito conveniente por ser mais intuitiva. Ao comprar um papel por R$10,00 e vender a R$12,00, é imediato o cálculo de que se ganhou 20%. Da mesma forma, se alguém fala que ganhou 30% em um investimento de um milhão de reais, automaticamente já se calcula que o sujeito ganhou R$300 mil.

No entanto, existe uma outra forma de se calcular o retorno de um ativo. Muito utilizado no mundo acadêmico, o log-retorno é bem menos intuitivo que o retorno linear, mas guarda propriedades matemáticas valiosas. Entre elas, a de que a magnitude das subidas e descidas são equivalentes, ou seja, se o preço tiver um log-retorno de -50% em um dia e no dia seguinte um log-retorno de +50% o preço ficou inalterado no período (diferente do retorno linear que teria uma queda líquida de 25%).

Mas como se calcula o tal do log-retorno? Deixamos a fórmula abaixo:

Na prática, o log-retorno e o retorno linear são muito próximos quando o retorno é próximo de 0, que é o que ocorre diariamente na maioria dos casos. A tabela abaixo ilustra esse ponto. Repare como em movimentos de até 1% quase não há diferença.

Como o exemplo do primeiro parágrafo se comporta no caso do log-retorno? Deixamos abaixo a simulação para um movimento de 10 passos de alta e de queda. Repare na simetria entre os log retornos nos dois casos e na diferença entre o retorno diário simples e o retorno acumulado.

De onde vem a sensação de que cair é mais fácil do que subir?

Você já deve ter ouvido que “no mercado se ganha de conta gotas e se perde de balde”, ou que “a subida é de escada, mas a queda é de elevador”, ou alguma outra expressão equivalente. É bem verdade que historicamente a velocidade das quedas é maior do que a velocidade das altas, e isso causa a sensação de que é mais fácil cair do que subir. No entanto, isso pouco tem a ver com a questão matemática discutida acima. Existe um fato estilizado em finanças que atesta que a distribuição dos retornos (ou log-retornos) é heterocedástica. Apesar do nome complicado, o significado nesse caso é relativamente simples: a volatilidade não é constante, e é maior nos momentos de retorno negativo. Na imagem abaixo pode-se ver a volatilidade histórica do Ibovespa, repare como a volatilidade apresenta picos em momentos de maior estresse no mercado, como no início de 2016 e agora em 2020 diante da atual crise. Ou seja, as quedas podem ser mais rápidas, mas não são necessariamente mais fáceis de acontecer.

Fonte: Bloomberg

Para ver os cálculos desse post com mais detalhes, basta abrir a planilha em https://docs.google.com/spreadsheets/d/1JUO_UR3yvAfJhrJTzBx2m5zAYYX60sARL8tjbOKe3D4/edit?usp=sharing