Linx (LINX3) – Quando altas expectativas geram assimetria negativa

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Como o Paulo bem escreveu no artigo sobre Weg: “De tempos em tempos escrevemos sobre empresas que consideramos excelentes, mas que por algum motivo se tornam uma posição vendida a descoberto para nossos fundos. Foram os casos da UltraparPorto SeguroRaia Drogasil e mais recentemente Klabin. Essas empresas compartilham algumas características. A primeira é que são empresas bem geridas, lideradas por pessoas com profundo conhecimento do negócio e bons resultados para mostrar. A segunda é que são empresas com ações relativamente “caras” ou com preço alto frente suas perspectivas de geração de valor para o acionista no tempo. A última é a função que elas servem na estratégia long & short do Versa: financiar uma exposição comprada maior que um patrimônio do fundo. Elas permitem o mecanismo que gera a alavancagem do Versa.”

A Linx é mais um desses casos. Atuando a mais de 30 anos no mercado de software para varejo, a Linx hoje detêm um market share superior a 42% nesse segmento.  Além disso, a alta satisfação dos atuais clientes se reflete em uma elevada taxa de renovação, que gira em torno de 99% conforme reportado nos últimos trimestres. A Linx possui uma grande oferta de soluções aos pequenos, médios e grandes varejistas, e se propõe a ser o one-stop shop quando se trata de software para o varejo com sua plataforma end to end que oferece de forma integrada ferramentas para gestão empresarial, soluções de pagamento, aplicações para e-commerce e omnichannel.

Antes de entrarmos na questão do porquê acreditamos que hoje a ação da Linx precifica um cenário demasiadamente otimista, vale a pena falar um pouco mais e diferenciar as 3 divisões de negócio da companhia, assim como foi feito no Linx Day de 2018 e no material publicitário relativo a última oferta de ações da Linx: (1) Linx Core, (2) Linx Digital e (3) Linx Pay Hub. A divisão Core diz respeito aos produtos tradicionais que permitiram a Linx ter uma fase de forte crescimento de receita até aqui, enquanto as outras duas divisões têm produtos desenvolvidos mais recentemente e visam complementar as ofertas da Companhia e capturar as demandas que surgem com as novas tendências do varejo como a omnicanalidade e o pagamento via QR Code.

  • Linx Core: A divisão é responsável pelos produtos carro-chefe da Companhia, o POS e o ERP, além de outras soluções correlatas. Segundo a empresa, o mercado potencial das divisões Core e Digital conjuntamente podem chegar a mais de 10 bilhões de reais. No segundo trimestre de 2019, a divisão Core foi responsável por mais de 70% da receita recorrente da empresa.
Fonte: Linx
  • Linx Digital: A divisão Digital é responsável por agregar e desenvolver as ofertas de Order Management System (OMS), Plataformas de e-commerce e marketplace. Tais ofertas permitem que os clientes da Linx (varejistas) ofereçam uma experiencia omnichannel a seus consumidores, ou seja, sem fricção entre os canais online e offline. O objetivo final das ofertas, além de uma melhor experiência do consumidor, é aumentar as vendas dos varejistas. Entre os clientes da solução de omnichannel da Linx estão as varejistas Restoque, Centauro e Hering. Hoje, cerca de 14% das vendas recorrentes da Linx vem da divisão Digital.
Fonte: Linx
  • Linx Pay Hub: Em fato relevante do dia 18 de outubro de 2018, a Linx anunciou publicamente o lançamento da Linx Pay Meios de Pagamento Ltda. O objetivo foi agregar todas as iniciativas da Companhia relacionadas à fintech, como o gateway de pagamentos (TEF), o Smart POS DUO e a nova solução de sub-adquirência (Linx Pay). Mais recentemente a empresa lançou a conta Linx, que é uma conta digital com cartão pré-pago nativamente integrada ao Linx Pay e que permitirá ao varejista o pagamento de contas e boletos, transferência para terceiros e funcionários, entre outros. Além disso, a empresa lançou o QR Code TEF, que integrará apps de pagamento digital com os varejistas clientes da Linx. Desde o lançamento do produto a Linx já firmou algumas parcerias com e-wallets, como a AME e o Mercado Pago. No segundo trimestre de 2019 a divisão de Pay foi responsável por cerca de 14% da receita recorrente.
Fonte: Linx

Mas se a Linx está num mercado atrativo e tem um produto bom, como ficar pessimista?

A Linx está inserida em um mercado que cresce a uma taxa média de ~5% até 2021 e deve continuar crescendo a taxas elevadas devido ao aumento da penetração de software no Brasil.

No entanto, apesar de ter o vetor positivo de expansão do mercado, acreditamos que o consenso já colocou o benefício do crescimento acelerado nos números, assim como os números de melhoria operacional da empresa. Nesse cenário, vemos um importante vetor negativo a frente das ações da Linx: a frustração das expectativas do mercado e consequente revisão para baixo dos números. Além disso, caso a empresa não faça jus às expectativas nos próximos anos, a ação deve sofrer um de-rating (redução dos múltiplos).

Após o anúncio da criação do Pay Hub, o papel mudou de patamar

Com o lançamento da solução de sub-adquirência, o papel passou a precificar um cenário mais positivo, assumindo que a Linx conseguirá capturar e monetizar uma parte relevante dos mais de 250 bilhões de reais que transacionam nos seus mais de 45 mil clientes. Em uma apresentação, a empresa colocou um slide falando que o potencial do Linx Pay seria de capturar metade dos 250 bilhões a um take rate de 1,3%, ou seja, uma receita de mais de 1,6 bilhões.

Desde o anúncio no dia 18 de outubro de 2018 até o fim do ano, ou seja em período de menos de 3 meses, a ação subiu 81,4% e as estimativas (consenso Bloomberg) de receita, ebitda e lucro para 2019 subiram 10%, 12% e 13% respectivamente. Apenas para se ter ideia, o lucro estimado para 2019 saiu de 110 milhões antes do Linx Pay para 124 milhões no último dia do ano (hoje, espera-se um lucro de 102 milhões, menos do que era esperado antes do Linx Pay). Mesmo com as revisões nas projeções, o múltiplo saiu de 26x para 42x P/E. Resumindo, alta do papel em 2018 foi resultado de uma rara combinação de revisões agressivas nas projeções e re-rating dos múltiplos. No entanto, vemos muitas dificuldades para empresa entregar o incremento de receita esperado para o Linx Pay, de tal forma que achamos difícil de justificar a subida abrupta da ação.

Mas o que garante que o rally aconteceu por conta do Linx Pay e não por outros fatores?

Após o re-rating, em abril a ação da Linx chegou a fechar acima dos 38 reais. No dia 18 de abril, no entanto, a ação caiu mais de 15%, bem no dia em que uma grande adquirente anunciou que zeraria a taxa de antecipação no crédito a vista, um aumento relevante de competição no setor de meios de pagamento. Em nossa opinião, tal movimento confirmou que as ações da Linx estão em grande parte precificando hoje a iniciativa de adquirência.

No dia 23 de abril a empresa soltou um esclarecimento acerca da movimentação atípica das ações: “A Companhia esclarece no seu ponto de vista as oscilações podem estar relacionadas às recentes ofertas anunciadas por adquirentes ligadas aos bancos de varejo, que tem gerado incerteza no mercado sobre às suas iniciativas no segmento de meios de pagamentos. (…)

(…) é importante ressaltar que a Linx mantém o seu foco na criação de valor para o varejista com uma plataforma disruptiva end-to-end que combina software de gestão, e-commerce e omnichannel que permanece como sua principal fonte de receita e crescimento. As iniciativas relacionadas ao mercado de adquirência continuam de acordo com seu plano de negócios, mas ainda são pouco representativas em relação à receita total da Companhia.”

Em nossa visão, as iniciativas da empresa ligadas a adquirência fazem parte de um posicionamento estratégico acertado de oferecer uma oferta completa aos varejistas, mas não vemos a operação de meios de pagamento da Linx como transformacional na mesma magnitude que o mercado está precificando. Explicamos mais abaixo porque.

As metas da empresa são agressivas, e o consenso dá o benefício da dúvida à empresa

Depois da divulgação do Linx Pay e diante da reação positiva do mercado, a Linx colocou uma meta agressiva ao seu management: alcançar em 5 anos uma receita de 1,3 bilhões de reais nas iniciativas ligadas a Pay, o que equivale a um take rate de 1,3% sobre um valor total processado de 100 bilhões de reais. Apesar de vermos com bons olhos a criação da meta aos diretores, não tomamos o alcance da meta como garantido.

Hoje, o mercado espera uma receita de 949 milhões para 2020 e 1,22 bilhões para 2021, com margem EBITDA de 27% e 28,6% respectivamente. Para o lucro líquido, o mercado espera 144 milhões em 2020 e 214 milhões em 2021. Se compararmos os números com as estimativas antes da solução de adquirência, isso significa que o mercado está esperando que o Linx Pay (apenas adquirência e novas soluções, pois o TEF por exemplo já existia) gere 100 milhões de receita adicional já no ano que vem. No consolidado, o mercado espera uma expansão de ROE de 6,6% em 2018 para 12,1% em 2021, nível maior do que o que a Companhia flutuou entre 2011 e 2018 (6%-11%). Parece agressivo em nossa visão, dada a perspectiva de investimentos elevados tanto para o desenvolvimento quanto para a comercialização de seus produtos.

A nossa análise de sensibilidade – mais evidência de que Pay está totalmente precificado

Não somos os maiores fãs do Fluxo de Caixa Descontado (DCF), pois o resultado é muito sensível em relação a inputs completamente incertos. Apenas a título de curiosidade, deixamos abaixo a análise de sensibilidade relativa as seguintes hipóteses:

    1. TPV total atingindo 100 bilhões de reais no fim de 2023, conforme metas da Linx
    2. Take rate e margem EBITDA são as variáveis na qual rodamos a sensibilidade
    3. Taxa marginal de imposto de 20%
    4. Reinvestimentos equivalentes a 2% da receita gerada pela divisão
    5. Divisão Core + Digital vale R$20 por ação, mais do que estava valendo antes da iniciativa de pay ser anunciada.

O resultado da sensibilidade do preço por ação:

Fonte: Versa Asset

Apesar de sermos céticos com os resultados provenientes de DCF, essa é mais uma evidência de que o mercado está precificando um cenário otimista.

Vemos risco de a empresa frustrar as (altas) expectativas e a underperformance recente continuar

Diante desse cenário de altas expectativas ligadas à divisão de meios de pagamento, vemos diversos desafios que possivelmente podem ser catalisadores para a empresa frustrar as próprias metas e a alta barra que o mercado colocou:

    1. O mercado de adquirência e antecipação de recebíveis está se tornando cada vez mais competitivo. Nos últimos anos, houve uma intensificação na competição entre as adquirentes. Isso se refletiu em uma rentabilidade cada vez mais baixa para a indústria, como exemplificado pelo yield de receita da Cielo, e em um cenário de preços ainda mais baixos a Linx terá dificuldades em atrair clientes se quiser manter a rentabilidade em um nível elevado.

      Fonte: Cielo
    2. Hoje a Linx ainda é apenas sub-adquirente. Isso significa que hoje parte da rentabilidade de suas soluções fica com a credenciadora. Para alcançar a rentabilidade prevista, é possível que a empresa precise se tornar adquirente, o que pode trazer riscos operacionais e custos inesperados.
    3. Um dos diferenciais do Linx Pay é o atendimento, e isso pode não ser escalável. Segundo a companhia, um dos responsáveis pela captação e retenção de clientes no produto de adquirência é o atendimento ao cliente superior ao das empresas incumbentes nesse mercado. Conforme o produto ganhe escala, porém, acreditamos que isso se traduzirá ou em um atendimento pior ou em custos mais elevados.
    4. De acordo com a teleconferência do segundo trimestre de 2019, os clientes atuais ainda não estão gerando o take rate de 1,3%. Normalmente os primeiros clientes abordados são os mais fáceis de serem captados e com maior potencial de receita, e de acordo com a teleconferência de resultado, o valor total processado está em 2 bilhões de reais anualizado e o take rate abaixo da meta de 1,3%, o que nos faz questionar se a empresa de fato conseguirá atingir o nível de receita prometido.
    5. Grande parte dos clientes da Linx já tem acesso a serviços financeiros. Apesar de ter clientes de diversos portes, os clientes da Linx no geral são clientes maiores do que os da Pagseguro e da Stone por exemplo. Dentro desse perfil, a maioria dos clientes é bem servido de serviços financeiros pelos bancos, além de ter algum poder de barganha com as adquirentes.
    6. No pagamento via QR Code, acreditamos que a receita seja bem menor. No pagamento via QR Code do Iti do Itaú, o lojista paga 1% por exemplo. Ao usar o agregador de QR Code da Linx, esse 1% seria dividido (não necessariamente igualmente) entre o Itaú e a Linx. Em um mundo que cada vez mais utiliza meios de pagamento alternativos, não sabemos se a rentabilidade das empresas na ponta da adquirência será mantida.

Ditos esses pontos, acreditamos que exista uma assimetria negativa nas ações da Linx. Vemos uma probabilidade maior da empresa esbarrar em dificuldades que impeçam a companhia de entregar os resultados esperados do que de haver uma execução impecável em todas as divisões da empresa. Se olharmos o ano de 2019, esse é um movimento que já está ocorrendo. Ao longo do ano as estimativas de lucro foram ajustadas para baixo e a ação underperformou o índice. Esperamos continuidade desse movimento para os próximos anos devido aos pontos supracitados.

Fonte: Bloomberg
Fonte: Bloomberg
Fonte: Bloomberg, Versa Asset

Estratégia de M&A é dilutiva para as margens, além do risco de integração

Durante a sua história, a Linx fez dezenas de aquisições. No entanto, temos dificuldade de enxergar o valor gerado aos acionistas pelas aquisições, uma vez que as empresas adquiridas no geral tem uma margem mais baixa do que a da companhia consolidada e a Linx já levantou capital algumas vezes para continuar com a sua estratégia de M&A, diluindo os acionistas. Entre 2011 e 2018 a margem EBITDA da Linx caiu de mais de 30% para menos de 25%, e apesar de terem efeitos de mudanças tributárias no meio do caminho, grande parte dessa mudança deve-se às aquisições.

A Linx deve continuar a fazer aquisições, seja para adquirir clientes, expandir oferta ou área de atuação, não a toa ela levantou recentemente mais de 1 bilhão de reais para seguir nesse caminho. Apesar disso, reiteramos que existem dificuldades na integração de empresas, e o mercado de M&A no setor é bastante competitivo, de tal forma que o risco de se sobrepagar por uma empresa não deveria ser desprezado.

Fonte: Linx, Versa Asset

Deixamos aqui uma provocação ao #FinTwit: Preço da ação igual a lucro?

Fonte: Bloomberg

A Linx está entre as ações mais caras da bolsa

Entre as ações do IBrX 100, a Linx hoje é a quarta empresa mais cara se olharmos o múltiplo Preço/Lucro 12 meses a frente. Se olharmos 24 meses a frente, é a sexta mais cara, e vale lembrar que os múltiplos são calculados com as estimativas de lucro que consideramos muito otimista. Quando comparamos com outras empresas do setor de tecnologia e meios de pagamento, a Linx também é a mais cara. Hoje a empresa negocia a um prêmio de 15% em relação a Totvs, 20% em relação a Stone e 60% em relação a Pagseguro. Vale destacar que a Linx deve crescer menos que a Stone e a Pagseguro nos próximos anos.

Além de ter múltiplo mais alto do que as outras empresas na bolsa, a Linx também está negociando a prêmio de seu múltiplo histórico. Em termos de Preço/Lucro, a empresa hoje negocia em seu patamar recorde a um prêmio de 67% em relação a sua média histórica. Na contra-mão do mercado, não esperamos uma expansão de ROE tão acentuada, de tal forma que vemos o múltiplo atual como muito exagerado.

Fonte: Bloomberg, Versa Asset
Fonte: Bloomberg, Versa Asset

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