As incorporadoras estão, desde o boom dos IPOs, entre os piores investimento da bolsa. O incentivo perverso da contabilidade levou as empresas a lançar empreendimentos alucinadamente, atingindo o pico de R$ 90 bilhões em 2013, pouco antes da grande crise brasileira. Com ciclo médio de construção de 3 anos, imóveis foram entregues ao longo de 2015 e 2016, momento que os juros voltaram a 14% e os bancos, preocupados com a inadimplência, restringiram a oferta de crédito. O resultado foi a massiva devolução de imóveis na entrega das chaves (distratos), quando o comprador quitaria o imóvel com o empréstimo de um banco. A ausência da entrada de caixa e o gasto com obras em andamento levou muitas empresas a atingir endividamentos alarmantes. A PDG, recordista brasileira em lançamentos, com VGV de R$ 9 BI em 2011, pediu concordata em 2017.
Nos últimos 2 anos os distratos foram o grande vilão para o resultado das incorporadoras. A legislação atual prevê que as empresas não podem reter mais que 25% do valor pago pelo comprador até o dia do distrato e, em alguns casos, as incorporadoras são condenadas a devolver até a corretagem para o cliente. Na contabilidade geralmente utilizada, o POC (percentage of completion), a empresa reconhece a receita e os custos do imóvel vendido conforme caminha a construção, proporcionalmente. Quando um imóvel é devolvido, a incorporadora é obrigada a retificar o lucro acumulado da unidade, contabilizando um prejuízo equivalente. Ainda, os imóveis prontos geram às incorporadoras custos mensais de condomínio e IPTU, além do custo de oportunidade do capital investido, o maior de todos. Por isso, muitas vezes é vantajoso para as empresas aumentar os descontos e fazer saldões, o que pressiona os preços e incentiva novos distratos.
Já sofrendo com as vendas baixas, nos últimos 3 anos as incorporadoras reduziram drasticamente os lançamentos, mas mesmo assim continuaram sofrendo com os distratos e acumularam altos estoques. As mais endividadas sofreram problemas de liquidez, precisando recorrer a aumentos de capital, como a Tecnisa em junho de 2016 e em março deste ano. As menos endividadas chegaram a uma situação de equilíbrio onde as poucas vendas líquidas, excluindo os distratos, são suficientes para cobrir o baixo consumo de caixa. No entanto, a ineficiência na estrutura de capital causada pelos estoques elevados reduz o retorno para o acionista, deprimindo o valor das ações.
No frigir dos ovos o problema são as baixas vendas, que dependem da disponibilidade de crédito para o comprador. O montante que o banco disponibiliza é função não só do valor do imóvel e da entrada, como também do percentual da renda que a parcela compromete. O comprometimento da renda, por sua vez, é função dos juros e do prazo de financiamento. Quanto mais longo o prazo, maior a incidência de juros nas parcelas iniciais (tabela SAC). Em um financiamento de 30 anos à taxa de 12% ao ano, por exemplo, o juro corresponde a mais de 70% das parcelas iniciais. Se o financiamento imobiliário acompanhar a redução na taxa Selic para os 7% estimados pelo mercado, a despesa com juros diminuirá em 40%. Com isso, a parcela ficará 28% menor, aumentando o interesse por imóveis mais caros e trazendo novos compradores. Pelo efeito da alta dos juros e pela crise econômica os bancos rejeitaram muitos pedidos de financiamento na entrega das chaves a partir de 2015. Com a queda do juros, a melhora na confiança e nas perspectivas econômicas, os bancos devem voltar a impulsionar o financiamento imobiliários, re-aquecendo o setor e ajudando as empresas a vender o estoque de imóveis prontos.
A concessão de crédito ainda continua deprimida, apesar da taxa média de financiamento ter recuado para os níveis de 2014. Quando a tese se concretizar, o aumento dos lançamentos/vendas permitirá às empresas apurarem maior lucro bruto, o que permite diluir os custos gerais e administrativos, aumentando a rentabilidade da companhia. Ainda, a venda dos imóveis prontos ajudará as empresas a pagarem suas dívidas ou distribuirem o excesso de caixa, aumentando ainda mais a rentabilidade. Empresas alavancadas, por outro lado, podem destruir bastante valor se as vendas demorarem para voltar.
Neste árido setor imobiliário, o segmento do Minha Casa Minha Vida faixas 2 e 3 é um oásis. A faixa 2 compreende apartamentos de até R$ 240 mil para famílias com renda de até R$ 4 mil e a faixa 3 R$ 9 mil. Além do incentivo do governo, que paga um pedaço da entrada e financia o saldo a juros subsidiados, o programa atinge uma camada da população com maior déficit habitacional, que consegue adquirir um imóvel pagando mensalidades equivalentes ao aluguel, o que faz da demanda resiliente. A melhor ilustração disso é a MRV, maior construtora do segmento, que bateu o seu recorde histórico de unidades vendidas no último trimestre. A Direcional, novo investimento da carteira, tem a operação de uma construtora no oásis e o valuation de uma construtora no deserto. O aumento da posição no setor foi feito em grande parte através dela.
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